2007/05/31

Barros Basto in Cecil Roth-a maranussim perspective-(English translation pending)
Alexandre Teixeira Mendes


Paul Goodman (left), President of the London Marranos committee and Co. (are the others Cecil Roth (middle) and Lucien Wolf?) in Porto.
(photo courtesy of Barros Basto Museum)




BARROS BASTO WITH HIS GRANDFATHER
(photo courtesy Barros Basto Museum)

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Barros Basto em Cecil Roth
– a perspectiva maranussim
(Barros Basto in Cecil Roth-a maranussim perspective-English translation pending)

Alexandre Teixeira Mendes

Os maranussim (cripto-judeus) associados ao nome de Barros Basto (1887-1961) e a uma herança prestigiada (na sua etimologia à parte: prae-stringere, prae "pré, antes", stringere apertar, constranger) atraiu, em sua fascinação, também a Cecil Roth (1899-1970). O Portugal dos maranussim desempenhou em Cecil Roth um papel de primeiríssima ordem. A singularidade marrana é, sem dúvida, um dos temas fundamentais da historiografia cecilrothiana: um tópico ímpar e padronizado, trazendo como consequência o cripto-judaísmo para o centro dos debates da historiografia moderna.
A obra de Cecil Roth marca uma etapa fundamental no (re)questionamento do marranismo dando claramente lugar à reflexão –interpelação e/ou identificação - do ethos dos maranussim (a sua natureza (in)comunicável, o seu carácter, a sua dignidade, a sua "eticidade"), ela já é um instrumento de trabalho indispensável para qualquer pesquisador. Os seus livros apresentam-se, assim, a quem os explore atentamente, mais fundamentais e precisos do que parecem à primeira vista. Associamos-lhe antes a ideia de "pioneiro".
A sua reflexão da experiência marrana reflecte-se na sua tentativa de compreender o seu carácter distintivo e absolutamente único. Muito custou e ainda custa aos historiadores descortinarem esta psicologia (da/ou (dis) simulação) do cripto-judaísmo português - como sistema de crenças e práticas - que se poderiam, grosso modo, classificar de sincréticas (há na sua estruturas sociais e culturais, desde início, um terreno fecundo de "contaminações").
O marranismo, no seu conjunto, significou forçosamente a posição de judeus desapossados, testemunhando uma espiritualidade condicionada pelo meio católico em que se desenvolveu. Queremos apenas ter em conta que a°∞mescla°±marrana se apresenta susceptível da intimidação e das compressões específicas do enredo da história até à modernidade (que suscitou no contexto português desfechos por vezes trágicos). Este enfoque crítico do cripto-judaísmo português – que remonta ao livro de Samuel Schwartz (1878-1953) Os cristãos-novos em Portugal o século XX (Empresa Portuguesa de Livros L. da, Lisboa, 1925), intérprete do património secular marrano – presente nomeadamente nas tradições e nas cerimónias em segredo em Belmonte - forneceram-nos as ferramentas essenciais para a análise do nosso património "secreto", enquanto religiosidade popular hebraica pluri-centenária, pouco valorizada na época. Este livro heteróclito, repleto de informações preciosas, transcreveu, a esse respeito, rezas e orações - a "verba visibilia" marrana - palavras visíveis - , semelhantes em forma e estilo aos "piutin" (poemas litúrgicos).

Identidade narrativa

Cecil Roth, como se sabe, dá início à análise sem "clichés" do passado judeu sefardita, renegado ou esquecido, como principal historiador, em inícios da década de 30, época que coincide com o auge do movimento resgate dos marranussim liderado por Barros Basto, tendo como núcleo identificável Trás-os-Montes e as Beiras, símbolo para toda uma geração que buscava sobretudo uma identidade judaica (aquilo que o filósofo Alasdair MacIntyre dá o nome de “identidade narrativa”).
No centro das suas investigações, situam-se os marranos - e, justamente, no decurso de uma "história viajante"- cujas raízes simbólico-religiosas vieram por excelência a servir como norte e inspiração. Ao longo do seu percurso académico na Universidade de Oxford retoma, de diferentes formas, as suas pesquisas em torno dos judeus maranussim, que marcaram de forma indelével a historiografia dos anos 40 e 50. Revela-se, então, uma constante: a atenção aquilo que pode justamente ser descrito como marranismo, no que Cecil Roth denomina "o episódio mais romantizado de toda a História", pautando-se por uma singularidade peculiar. Dito isto, não surpreenderá a sua amizade com Barros Basto - um dos protagonistas do resgate dos marranos portugueses – que o autor de A History of the Marranos conheceu somente em 1929. Recordemos brevemente as etapas mais evidentes desse processo.

Figura incontornável

No estudo do marranismo em que se desenvolve a reflexão de Cecil Roth, não é possível não se deter diante do tipo de "cristão novo" actuante que constitui, para ele, a figura incontornável de Barros Basto: daí provém um relacionamento em que se opera um profundo deslocamento do seu campo investigativo (a historicização do marranismo).
Escritor exigente e informado, com uma formação talmúdica de base, Barros Basto entreabre-lhe, tanto quanto possível, o véu da história dos marranos. Ora, o que aos poucos se torna claro, sobretudo depois de 1929, quando se conheceram, é que a tomada de consciência marrana de Cecil Roth deixa de ser uma mera abstracção. Nos anos 20-30, o cripto-judeu (como o marrano) tornara-se uma 'figura improvável”. Admite, pelo menos depois desta data, a sua vontade de escrever o majestoso e longo empreendimento de História dos Marranos Este ensaio, onde alia uma cultura fascinante, um carácter de historiador erudito à moda antiga e preocupações metodológicas das mais exigentes, não pretendeu esgotar a resposta a todas as perguntas. O seu propósito foi o de retomar o problema da originalidade marrana: o °∞marranismo em movimento”. Na séria, profunda e honesta reflexão acerca das principais °∞figuras” marranas - em distintas épocas e lugares do passado e do presente nas quais o marranismo se estruturou como "nation" (nação) - , o nosso autor estudou a amplitude dos acontecimentos do passado histórico e os obstáculos colocados a uma existência e uma fé plenamente vivida no presente.
Literalmente fascinado pelas questões da "religião dos marranos"- este lugar privilegiado dos “sincretismos” que não é, a maior parte das vezes , senão uma relíquia do passado-, Cecil Roth estudou substantivamente o seu núcleo heterogéneo e as suas expressões históricas concretas (demonstrando uma grande familiaridade com os temas ancestrais do cripto-judaísmo). O nosso académico acabou por representar bastante bem o centro da gravidade da configuração complexa da nova historiografia judaica – uma via de "desmitização"- que se condensa no espantoso empreendimento de uma investigação que não cessou de crescer ao longo dos anos.
A influência carismática de Barros Basto sobre Cecil Roth – tendo presente a sua acção educadora, selectiva, cogitante de um demo-liberal que, no quadro histórico do fim do século, re-ligou experiências diversas com uma particular intensidade – é bem patente neste historiador anglo-judeu conhecido pelas suas ideias geniais e audácias interpretativas. A amizade, a atenção simpatizante, persistiu, mesmo após o "processo ardiloso” - com a acusação de homosexualidade a Barros Basto - , que culminou com a sua destituição do Exército em 1943, e em que se assiste ao seu “assassinato”: da sua identidade e personalidade jurídica e moral. Desde o início, Barros Basto polemizou com a realidade bifronte portuguesa – o totalitarismo do Estado Novo de estruturas fortemente repressivas e cerceadoras das liberdades fundamentais após o ter apoiado – cujo movimento de resgate suscitou, definitivamente, a inquietação e a hostilidade dos poderes estabelecidos da direita tradicionalista e arcaica enquanto tal (os sectores clericais-integristas, monárquico-legitimistas, corporativos e judaicos mais reacionários).

Condição marrana

Assinalei a importância que parece ter tido Barros Basto na realização da monumental História dos Marranos. Não é exagero dizer que poucas coisas de que conhecemos foram de tão grande importância como a amizade entre Cecil Roth e Barros Basto. Tente-se agora reflectir um pouco sobre ela. E para que se compreenda melhor esta amizade que nasceu durante uma viagem de caminho de ferro – o Sud-Expresso - ao Porto, em 1929, interessa referir, antes de tudo, o opúsculo de 29 páginas O Apóstolo dos Marranos, escrito em Londres, Julho desse mesmo ano, de que só conhecemos a versão francesa publicada por L`Univers Israélite, 20, Rue Turgot, Paris (existente na livraria da sinagoga do Porto).
O professor da Universidade de Oxford (Inglaterra) e um dos fundadores do Portuguese Marranos Commitee de Londres visitou juntamente com a sua esposa as velhas judiarias da cidade, o terreno da futura sinagoga e a sede da Comunidade Israelita do Porto assistindo a ofícios religiosos no seu oratório, tendo conferenciado largamente com Barros Basto. O Apóstolo dos Marranos não teve novo contacto com Cecil Roth até ao ano de 1931, quando de uma nova visita ao burgo portuense.
Poder-se-ia dizer que Artur Carlos Barros Basto representou - para Cecil Roth - a condição marrana -– maravilhosamente situado e influente na sua época: primeiro, porque o seu temperamento particular está em intenso acordo com da consciência dramática contemporânea, mantendo-o sempre aberto à interpelação das "fundações secretas" do marranismo, e, em segundo lugar, porque dispunha de admiráveis fontes de comunicação. A sua inteligência penetrante e multiforme fê-lo reconciliar com o seu destino: a obra de magistério (com a institucionalização do movimento de resgate que sela, então, uma aliança com o despertar marrano, a iniciativa das primeiras comunidades nas Beiras e Trás-os-Montes). Por outro lado, poderíamos, a rigor, falar de uma personalidade maleável e flexível – muito embora militar de carreira - , que revelou, marcadamente, uma faceta de escritor que se desdobra em metafísico, ensaísta e sobretudo em publicista. Quase somos tentados a afirmar que nele preexistem os três tipos fundamentais da espiritualidade judaica – o piedoso, o justo, o sábio. Daqui a reconhecida necessidade da liberdade de pensamento e democracia cultural que são próprias do judaísmo. Enfim: a liberdade de interpretação, discussão e confronto tão presente na história da Sepharad. Assim, se bem se considera, o pensamento judaico, no seu filão central – avesso à ideia de dar origem a um sistema explicativo, a uma escola filosófica ou religiosa particular – que culmina no ideal da vida segundo a Torá - , julgou construir a cidade de Deus no tempo, neste mundo (Olam Hazé), sem se perguntar quando o tempo vai atingir seu fim escatológico no mundo por vir (Olam Habá). (Evaristo E. De Miranda, José M. Schorr Malca, Sábios Fariseus, Reparar uma injustiça, Edições Loyola, São Paulo, 2001, p.76).

Encontro-chave

Este “encontro-chave” de Cecil Roth com Barros Basto, se lhe dermos o seu sentido integral, trouxe muitos benefícios a ambos. Posteriormente o apoio de Cecil Roth ao "Movimento de Resgate" foi crucial e, quanto a isso, Barros Basto teve para com ele, indubitavelmente, uma dívida de gratidão. O historiador de Oxford que ficou fascinado com a personalidade de Barros Basto escreveu: "O homem com o qual me encontrava pela primeira vez, é sem dúvida uma das mais marcantes personalidades hebraicas do nosso tempo". Naturalmente que essa simpática referência deve ser situado não só historicamente mas também num contexto em que se ia desenrolando e aprofundando o movimento de resgate dos marranos. De salientar que o artigo acabou por ser publicado nesse mesmo ano nos números 25 - Porto – Tebet de 5690, Ano IV - e 26 - Porto – Kislev de 5690 (1929 e.v.), ano IV, - do orgão da Comunidade Israelita do Porto - Ha-Lapid - dirigido por A. C. de Barros Basto (Ben –Rosh), numa tradução do italiano de José Pardo Roques.
Mas havia outras razões, além do que podiam parecer predominantemente sentimentais, para que Cecil Roth se sentisse fascinado perante Barros Basto. Outros de modos de olhar para Barros Basto pecaram, indubitavelmente, pelas suas vistas curtas e estreitas. Ele colocou-se, não apenas como restaurador da velha tradição marrana, tão fielmente quanto possível, o que lhe granjeou a simpatia de espíritos heterodoxos, mas ainda como líder religioso e cidadão atento às “virtudes cívicas” republicanas, o que lhe valeu a animadversão dos conformistas e dos reacionários. Para cumprir a sua missão, foi obrigado a medir as suas acções, a tentar dominá-las, colocando-as ao serviço do bem comum. Dotado de um sentido político pouco vulgar, e, sobretudo, pragmático - arte de tomas decisões, no fundo, - fez face constantemente a urgências, a obstáculos inesperados, surpresas, consequências subsidiárias, manigâncias e manobras, que pareciam ocasionalmente querer comprometer o resgate. Já o demonstrámos: adoptando uma atitude olímpica no plano da acção deu origem a muitas confusões e equívocos. Ele colocou-se diante de uma encruzilhada dos caminhos da história: lutou contra o conformismo e a apatia social; as manobras de bastidores, chantagens e artimanhas, duplicidade e intrigas de um poder arbitrário.

Magnetismo

Impressionado pela personalidade, o temperamento nada acomodatício de Barros Basto, "talvez a mais magnética de quantos eu me havia aproximado", conforme assinala no seu opúsculo - Cecil Roth refere-se à sua actividade e energia ao enquadrar o grande desafio sócio-histórico do resgate. A figura de Barros Basto é, não raro, mitizada e alçada à altura do herói. Dado que a sua acção traduziu-se numa revitalização de todas as forças judaicas: chegou às bases populares. A sua estratégia foi iniciar ab ovo um tipo diferente de comunidade, do qual sairiam rabis novos. A chave era introduzir uma prática religiosa diferente com uma liturgia sefardita adequada: criar seminários onde os formadores seriam importados da Europa e reforçar mais e mais a ligação directa ao centro condutor do resgate dos marranos – Porto e seu Instituto Teológico. A orientação original do seu “propositum” não é a fuga mundi mas comunional. Neste ponto é ainda necessário salientar o seu magistério socrático - nítido, inequívoco- de transmissão oral, mesmo em condições extremamente desfavoráveis.
Uma vocação marrana vivida em toda a sua integridade informou todos os aspectos da existência de Barros Basto. Através do seu ministério recrutou e formou marranos (com o auxílio de cooperadores e de animadores capazes de conjugar as dimensões caritativa, litúrgica e comunitária). Mais: de um modo pungente e inteligente, sem usar a propaganda em grande estilo, sondou as vias da lucidez e da acção - definiu estratégias – no caminho da direcção espiritual.

Edifício invisível

Persiste ainda hoje uma longa e complexa discussão acerca do marranismo historizado por Cecil Roth (que re-descobriu o seu “edifício invisível”). Na problemática actual, há um facto de toda a evidência: o reconhecimento da aventura marrana que acabou por se tornar uma experiência psicológica complexa. Concretamente, em Portugal, o marrano recusou a sua não-significação. Os marranos, como os chuetas, permaneceram excluídos e limitados nas suas opções espirituais (mesmo que nos limites das variantes contextuais e situacionais). Por isso é que se, aprofundar-mos um pouco a forma como os marranos se colocam sob a égide das hibridações culturais, descobriremos uma vocação compósita, ante as circunstâncias limitadoras ou adversas, de transposição das fronteiras (interiores e exteriores) sob o signo de um compromisso defensivo: o sincretismo heterodoxo.

Alexandre Teixeira Mendes

2007/05/21

THE INQUISITION IN PORTO

STAIRS OF THE ESNOGA (SYNAGOGUE), OLIVAL JUDIARIA (created 1386)


The Inquisition in Porto
mlopesazevedo

There has been very little published about the Inquisition in Porto. This is a short summary of two articles on the subject, one by Amilcar Paulo (a protégé of Barros Basto), A Inquisição no Porto, Achegas para a sua Historia, Separata de Douro Litoral-Boletim da Comissão de Etnografia e Historia-None Serie-Vol II, Porto, 1959, and Elvira Cunha De Azevedo Mea, A Inquisição do Porto, Separata da ‘Revista de Historia’ Vol I, Centro de Historia Da Universidade Do Porto, 1979, Porto. Professor Mea is presently writing a book about the Inquisition in Porto.

According to Amilcar Paulo (deceased) on June 30, 1541 king John III ordered the Carmelite bishop, Baltazar Limpo, bishop of Porto to institute the Tribunal of the (un)Holy Office of the Inquisition. On February 11, 1543, the Tribunal held the first and only auto de fé. Three scaffolds were constructed. There were 84 penitents, of which 21 were burned in effigy, 3 women and 5 men were burned alive, 4 padeceram, 15 were sentenced to perpetual jail with sabenito and 43 received prison sentences between 1 and 10 years. The auto lasted until 5 pm, with 30,000 people in attendance. The Tribunal was extinguished in Porto in 1544. Paulo reproduces several historical documents such as the edict of king John III establishing the inquisition.

Professor Mea, who knew Almilcar Paulo, is much more circumspect. She notes that not much has been added about the Inquisition in Porto since Alexandre Herculano’s classic , History of the origin and establishment of the Inquisition in Portugal (1854). She does not give much importance to Herculano’s opinion that the Inquisition in Porto was motivated by vengeance of the Inquisitor, bishop D. Baltazar Limpo whom he describes as impetuous, obstinate, and fanatical. According to Herculano, the bishop was angry with the New Christians for not paying the cost of converting the synagogue to a church and the re-paving of Rua de São Miguel in the former Olival Judiaria.

Apparently there were a great number of New Christians living in the Ribeira neighbourhood (the then docklands), selling ready-made clothes who complained of exorbitant rents. In 1533 and 1534 they made a proposal to the City to return to the place of their ancestors, the Olival Judiaria, and promised to contribute towards the construction of a church, (the present church of "Our Lady of Victory" on Saõ Bento da Vitoria street is believed to be the site of the former synagogue of the Olival Jewish quarter) and the re-pavement the street of São Miguel, where Uriel Acosta (Gabriel da Costa) was born. As of 1547, there still had not been an agreement. By that time bishop Limpo was no longer in Portugal.

Mea, who writes twenty years after Amilcar Paulo, prefers to start anew, relying on five packets of documents then recently discovered at the Torre de Tombo, the national archive. Her partial analysis of the documents, which were in poor condition, indicates that cases before the Tribunal occurred between 1541 and 1546, with the greatest concentration was in 1542-1544. There is also mention of a visit by the bishop of Porto to Mesão Frio (up the Douro river) in 1542. Mea examined one document in which 56 witnesses were heard in one day resulting in the denunciation of 30 New Christians. Evidence also revealed that a good number (26) of the incriminated were absent, many for more than a year, some having fled to Lisbon and Lamego before leaving the realm.

Mea finds cases from Porto mistakenly listed in the Coimbra Inventory of Inquisition cases (Inventario dos Processos da Inquisiçao de Coimbra,1541-46). There she finds 78 cases from Porto, some involving more than one accused. Analyzing additional sources, she found a total of 111 processes from Porto, some duplicated. Mea studied 54 cases referring to 93 individuals. Some files are incomplete.

The tribunal was situated at the pousadas (manor house) of the inquisitor Jorge Rodrigues on Rua Chã. The prisoners were lodged in the bishop’s prison but in 1544 there is evidence of a new prison on Rua Escura. In one of the later processes (1545-47) of Leonor Gomes and João Serrão, merchants, we learn that the vicar, João Ferreira had replaced the bishop.

The professor states that it is not possible to fully analyze the nature of the inquisition in Porto as the institution was in its infancy and there was a lack of general applicable rules throughout the realm, rather it depended a lot on the character of the individual inquisitors. In Porto, one of the Inquisitors suspected anyone whose parents were forcibly baptized or who lived with a New Christian, like Violante Dias and her husband Antonio Dias, imprisoned for two years. Another example is Genebra Gomes, a widow of 80 years, born on Rua de São Miguel, baptized as an adult in 1497 and who spoke Hebrew. Her case stands out because she prayed frequently in Hebrew and observed Pessach and Yom Kippur.

Mea notes that the absence of 26 accused and an additional 7 whose whereabouts were unknown, is evidence of the economic power of Porto’s New Christians and their ability to easily escape the clutches of the Inquisition. Their economic power may also explain the rigid and inflexible attitude of many of the accused and witnesses who were uncooperative and refused to corroborate with incriminating evidence. Some witnesses were imprisoned, like Leonor and Eva Gomes, aunt and niece of Genebra (who also spent two years in prison) for interfering with witnesses. There were many appeals by accused persons and many allegations of illegality on part of the Tribunal, such as not releasing prisoners once their cases were completed.

Pursuant to the documents Mea studied, there were at least two auto de fés in Porto, one on February 11, 1543 at the field near the gate of the Olival and another at the same place on April 27, 1547. The Tribunal in Porto ended with the papal bull of Paul III on July 16, 1547. It was never re-instated, cases from Porto were dealt with by the Inquisition tribunal of Coimbra.

2007/05/16

LISBON 1506, THE MASSACRE OF THE JEWS, book review

The author Susana Bastos Mateus with Yaacov Gladstone at the Alberto Benveniste Centre for Sephardic Studies at the New University of Lisbon.


Authors Susana Bastos Mateus and Paulo Mendes Pinto
at recent book launch in Lisbon




BOOK REVIEW

Lisboa 1506, O Massacre Dos Judeus
Lisbon, 1506, The Massacre of the Jews


Susana Bastos Mateus, Paulo Mendes Pinto, 2007, Alêtheia Editores, Lisboa.

By mlopesazevedo
(www.friendsofmarranos.blogspot.com)

This is the first non-fiction book in Portuguese, about the massacre in Lisbon of 4,000 Marranos*, Jews who were forcibly baptized in Portugal in 1497. During three days at Pessach (Passover), in April 1506 (Nisan, 28,29,30, 5266), an unruly mob, incited by fanatical Dominican monks killed between 1,000 and 4,000 innocent men, women, and children.
Apart from reference in Alexandre Herculano's classic, History of the Origin and Establishment of the Inquisition in Portugal in the mid 19th century, there has been virtually nothing written by modern Portuguese authors on the subject. The massacre was described in one of the earliest books written in Portuguese, Samuel Usque’s Consolação às Tribulações de Israel, Ferrara, 1553,

Among these were two Dominican friars, who went through the city of Lisbon with crucifixes on their shoulders, inciting the people and calling for all to join them to avenge the death of their god…they attacked the weak and defenceless group of ill-baptized New Christians with spears and unsheathed swords. They killed four thousand of them…

(English translation of Martin A. Cohen, Consolation for the Tribulations of Israel, The Jewish Publication Society of America, Philadelphia, 1977, p. 205)
The co-authors of this small but well organized book, instructors at the Alberto Beneviste Centre for Sephardic Studies at the New University of Lisbon, refer not only to Usque and other contemporary accounts but also review modern articles and reviews such as Yosef Hayim Yerushalmi’s, Le Massacre de Lisbonne en 1506 et l’image du roi dans le Shebet yehudah, Sefardica, Paris, Chandeigne, 1998.
The book starts with a much needed succinct overall history of Iberian Jews, including their mass migration to Portugal in the 14th and 15th century, especially after the Edict of Expulsion of 1492 by the Catholic Monarchs which resulted in over 100,000 Jews entering Portugal, then with a population of about one million. Although in December 1496, King Manuel, under pressure from his Spanish in-laws, ordered Jews to leave by October 1497, he changed his mind, prohibited their departure and forcibly baptized them in 1497.
The massacre occurred at the height of the plague when over 100 people were dying each day in Lisbon. The Jews were of course blamed for the plague and the prolonged drought. The King had fled Lisbon. During a service on Sunday afternoon at St. Dominic’s church (still standing in Lisbon, next to the Rossio), a New Christian questioned a claim of a supposed miracle involving the crucifix, perhaps pointing out that a piece of wood was incapable of a miracle (the contemporary narrations differ). He was dragged out to the square in front of the church, beaten and quartered before being burned. His brother met the same fate. For three days the rioting and looting continued. The elderly and the young were not spared. At one point there was a mound of over 400 dead bodies in the Rossio (the main square of downtown Lisbon). At one point, German merchants paid for wood for the pyre, which had run out.
Soon after the massacre the King ordered the public execution of the two Dominican monks and about 60 ringleaders. He withdrew certain privileges and imposed sanctions on the city of Lisbon. He renewed for another 20 years, the period in which the former Jews would not be subjected to inquiries about their private religious practices (hence the formation of a unique Marrano culture in Portugal). He also permitted the New Christians to leave the realm and sell their possessions.
The authors offer a historical and political analysis of the consequences of the massacre as well as generous historical explanatory notes throughout the text, making this a useful text to
ordinary readers. A review of Jewish and non-Jewish literature, as well as an extensive bibliography should also appeal to scholars.
The occasional black and white image, mostly of Inquisitorial scenes (there is only one known contemporary image of the massacre itself) lends the work an aura of authenticity and sombreness.
This book a welcome addition to a growing body of recent books on Portuguese Jewish history which are slowly uncovering the constructed memory loss which has concealed the true history of Portugal for far too long. For a fictional account of the Lisbon massacre, see Richard Zimler's 1998 novel, The Last Kabbalist of Lisbon, available in several languages. The Friends of Marranos (friendsofmarranos.blogspot.com) are accepting donations for the translation and publishing of this book into English.

*Marranos, at one time a pejorative term applied to Jews who were forcibly baptized in Spain in 1391 and in Portugal in 1497, is in common usage by some academics in Portugal who attribute its origin to the Aramaic-Hebrew Mar Anus, forced one, like the widely used Hebrew term today, Anousim. Christianity adopted the nomeclature of Converso or New Christian, who were not necessarily Marrano. The term Marrano is used here because of its association with the forced baptism of 1497 and the Inquisition, its acceptance in Portugal, and its growing meaning as a badge of identity and resistance to the demonic unHoly Office of the Inquisition (which still exists!).


2007/05/14

BOOK REVIEWS

Book Comment, Portuguese Jewish history


Inquisição e Independência, Um Motim No Fundao-1580
Inquisition and Independence, A Riot in Fundão-1580



Author, Maria Antonieta Garcia autographing books at a recent book launch in Lisbon


Book Comment, Portuguese Jewish history

mlopesazevedo

Inquisição e Independência, Um Motim No Fundao-1580
Inquisition and Independence, A Riot in Fundão-1580

Maria Antonieta Garcia, Alma Azul, Coimbra, 2006, 227pp

Synopsis

This book is about a riot in the 16th century in Fundão (near Belmonte), the only known public act of resistance against the unHoly Office of the Inquisition to have occurred in Portugal.

On November 22, 1580, in the town of Fundão, in the Beira region, not far from Belmonte, Damião Mendes, a bailiff of the unHoly Office of the Inquisition reported that he was received at the door of a church by Estêvão Sampaio, the senior alderman in the town, and armed men who meant to kill him. He said they confronted him with the intention of impeding the work of the unHoly Office of the Inquisition. Bailiff Mendes complained of being pushed and knocked down, that the armed men broke his rod and took away his sword, that he was left without his hat and cape, and that he fell to the ground. They cut loose his horses and roughed up one of his men. He alleged that Sampaio spoke harshly to him and was rude, that he told him that he would take his rod and, lhe meteria pelo cu acima, and other such vulgar words.

As was customary in that period, the bailiff would have arrived in Fundão secretly, then made an announcement to the population to attend church on Sunday in honour of some saint. When the church was full, the doors would be locked by guards and the Old Christians would be called upon to identify the New Christians who would be handcuffed and led away to the subterranean jail cells of the unHoly Office, except this time, the secret was discovered and the bailiff was in for a surprise.

Esther Muznick, vice-president of the Israeli Community of Lisbon described the book as a good crime novel at the launch of the book in Lisbon. There is an excellent bibliography, several annexes of historical and documents, and twenty pages of the names of the victims of the Inquisition from Fundão from 1582 to 1754.

Maria Antonieta Garcia, born in Fundão, a retired professor of Sociology at the the University of Beira Interior where she founded the Centre for Jewish Studies, is the author of numerous books on Portuguese Jewish history including the critically acclaimed, Judaismo no Feminino (1999), an analysis of the community of Belmonte. Regrettably, none of her books have been translated to English, something the Friends of Marranos hopes to change.

Historical Background, and Portugal’s Marrano King*

In 1578, with the disappearance of King D. Sebastian (unmarried) at the ill-fated battle of Alcacer Quibir (yet another attempt to invade Morocco), Cardeal D. Henrique, Inquisidor general, acceded to the throne. The Cardinal was the only brother of King John III who brought the Inquisition to Portugal after Marrano bribes paid to the Pope and Cardinals were no longer effective. In 1580, with the death of Cardinal Henrique, three nephews/nieces claimed the throne, D. Catarina de Bragança, daughter of the Infante (i.e. prince) D. Duarte and D. Isabel of Bragança, Filipe II of Spain, son of D. Isabel of Portugal and Emperor Charles V, and D. Antonio, Prior of Crato, son of the Infante D. Luis, Lord of Covilha, and Violante Gomes, a New Christian.
The major opposition to Filipe II of Spain was D. Antonio, Prior of Crato. He was acclaimed King in Santarem (a city north of Lisbon, the wealthiest Jewish community at the time of the taking of Lisbon in 1147), in June of 1580. He proceeded to Lisbon where he was received with great jubilation. However, the nobles sided with Philip of Spain and Antonio was defeated in August, in Alcantara. His reign lasted two months, although he attempted to rule Portugal from the island of Terceira (with English and French support) until a Spanish fleet defeated him in 1582. It was during this period of uncertainty and political crisis that the riot of Fundão occurred. The author flushes out this historical setting in the book and annexes several historical documents.

From the Back cover of the book

In July, Fundão, the town where the riot occurred, Estêvão de Sampaio, captain, was the eldest alderman. New Christians struggled against the Inquisition, and everyone, New Christians, and Old Christians, opposed the claim of jurisdiction by neighbouring Covilha and Guarda. They defended the autonomy of their municipality. This is the only known episode of resistance to the Inquisition in Portugal.

Notes
1. Fundão is in the Beira region (near Belmonte). This area, a refuge for Jews, grew demographically since 1391 after the progroms in Barcelona, Sevilha, Toledo, Valencia and Cordova when entire Jewish communities were wiped out. In Sevilha, in 1391, over 4,000 Jews were killed in one day. Following the Edict of expulsion of 1492, the Jewish population of Portugal, and especially Beira swelled again. The street name, Rua Nova (New Street), found in many towns and cities in Portugal is often associated with expansion of the Judiarias during the 15th century. Antonieta Garcia accepts that no less than 120,000 Jews entered Portugal in 1492.

*Marrano, at one time a pejorative term applied to Jews who were forcibly baptized in Spain in 1391 and in Portugal in 1497, is in common usage by some academics in Portugal who attribute its origin to the Aramaic-Hebrew Mar Anus, a forced one, like the widely used Hebrew term today, Anousim. Converso or New Christian often replaces the term, but not all Conversos or New Christians, a term adopted by Christianity, were necessarily forced. The term Marrano is used because of its acceptance in Portugal, its association with the forced baptism of 1497 and the Inquisition, and its growing meaning as a badge of identity and resistance to the unHoly Office of the Inquisition (which still exists).

2007/05/12

2007/05/08


Entre a contra-história e as heresias
- a liberdade versus a ortodoxia

Alexandre Teixeira Mendes

Será que a história não passa de um cruel fardo de repressão? Seremos todos vítimas de uma história patológica? Esta característica peculiar da violência – um dos nomes do pecado original - que acompanha a humanidade, desde o início, apoia-se na incapacidade de reconhecer o “outro” (o simples e cruel desejo de impor um “outro”).
O questionamento da violência e da religião tem sido acompanhado de uma revalorização da material narrativo das minorias antes marginalizadas – da assim chamada “marca de infâmia” ou das heresias - , e não é sem razão que se insiste tanto na noção de uma “contra-história”.
Será possível uma história da “contra-história” dos traços da religiosidade que nos afiguram mais característicos do Ocidente? Não falando já da filosofia e as traves-mestras da contra-tradição hedonista que nos levam ao centro da problemática de Michel Onfray? Sabendo de antemão que a historiografia dominante no Ocidente liberal é platónica (Contre-histoire de la philosophie 1, Les sageses antiqúes, Bernard Grasset, Paris, 20006)?

O errático e o desviante

Não é exagero toda a atenção que se peça para a importância das categorias de heterogéneo, do errático, do descontínuo e do contraditório - valorizando as “paisagens” que denominamos, genericamente, “alternativas”. Poderemos simplesmente pensar a história ocidental através da categoria homogénea que deixa de fora as “realidades múltiplas” que fazem a diferença? Será que tudo o que pretendemos mostrar é a importância da heterodoxia filosófica-poética e da livre-imaginação religiosa (por vezes mesmo do desviante, do pouco razoável e do ilícito)? Contrapondo o ponto de vista de uma “história de vencidos” poderemos reivindicar expressamente o “anjo da história”? Que pressupõe tematicamente uma reflexão sobre a “redenção” necessária?

O mal em questão

Parece a todos evidente que vivemos num tempo a ou pós ideológico lido de um ponto de vista pós-nacionalista. Momentos propício para questionamentos “ad marginem”. Tornou-se hoje um lugar comum sustentar que a cultura moderna foi a portadora (ou a encarnação) do mal. Com efeito, como já vimos várias vezes, os campos de extermínio do nazismo e do estalinismo expressaram o lado obscuro de todo o acontecimento: o vértice insuperado da infâmia. Parece, pois, que a história humana ficou à mercê da loucura e do crime: dos autos de fé. Pode-se, no entanto, falar do “problema da culpabilidade” após a II Guerra Mundial? Quando a sabedoria dá testemunho de que o trágico, a dor, o sofrimento, estão associados à “conditio humana”?

Dissenso e sagrado

De uma maneira geral pode dizer-se que nunca se assistiu verdadeiramente, no caso do mundo ocidental, ao eclipse do sagrado. E isto em dois sentidos. Primeiramente, porque o predomínio de uma dimensão da racionalidade vinculada à ciência, a técnica e a produção não reprimiu a estrutura mágica-religiosa do homem moderno. Em consequência, o sagrado se mesclou nos interstícios do profano (as ritualizações e hierofanias camufladas mostram-nos isso claramente). Sabemos que as religiões dominantes legitimaram - na sua proeminência dogmática - os “arcanos da dominação” mostraram-se mesmo incapazes de dar relevo aos heterodoxos e livres-pensadores. Evidentemente, isto quer dizer que quando hoje falamos das religiões institucionais, verificamos o fim do monopólio das tradições religiosas. A isto se junta ainda algo de mais lato e significativo: a manifestação do sagrado selvagem, entregue às vivências pessoais, individuais em processo crescente de privatização e individualização. Hoje ao integrismo e ao fundamentalismo não lhe merece nenhuma confiança o pluralismo institucional e ideológico: mais ainda, toma-a como um inimigo para a fé. A “ortodoxia” religiosa tornou-se problemática na sociedade moderna: impossível dada a sua vertente totalitária.

Sanção e perseguição

A própria noção de heresia (do grego hairesis que significa escolha) aparece, no espaço euro-ocidental, após a “mudança constantiana”. A verdade é que com a constituição do catolicismo em religião de Estado, em 325, emerge, em larga medida, um sistema compacto de crenças unificadas – assente em postulados rituais, sacramentais e catequéticos fechados – que instaura, na prossecução dos seus objectivos englobantes, uma tirania eclesiástica. Esta visão unilateral - assente na dialéctica da interpretação única, pura ou autêntica - , remete-nos para a processualização da sanção e da perseguição.
No “Les Hérésies” (Heresias, Lisboa, Antígona1995), Raoul Vaneigem tem a particular preocupação em fazer entender que, no plano religioso, temos atrás de nós uma “história oculta” de variantes espirituais reveladoras da experiência intensa do numinoso – um “contra-discurso” heterodoxo face às igrejas estabelecidas (a tradição teológica-religiosa porta-voz de um autoritarismo centralizado em Roma). Talvez se deva reconhecer que a cristandade foi marcada pela adopção do esquema imperial. É a partir desse ponto que se compreendem os surtos carismáticos, messiânicos, escatológicos que abalaram a igreja visível e institucional. Porque está o elemento decisivo no culto do “Livre Espírito”? E como se pode ainda compreender essa galáxia de heresias classicamente apreendidas como um dado objectivo desconhecido (o que se poderia chamar de bipolaridade da inquietação entre um milenarismo revolucionário e o anarquismo místico)?

Poder versus verdade

O advento do que queremos falar é o da tomada de consciência gradual da tensão entre autoridade e dissensão: a revelação profana. Um golpe de vista agrupará algumas das formas heréticas e aproximar-nos-á do seu carácter: albigenses ou cátaros, valdenses, os pseudo-apóstolos ou apóstolos de Cristo, Joaquim de Fiori, os beguinos, etc., etc.. O “dissenso” tornou-se um sinal de heresia. Para a igreja ocidental, totalitária, a heresia identificou-se a desvio e a danação, fundada no pressuposto despótico e monopolista do poder e da verdade (embora se admita que a lógica da coerção e da superstição – a “guerra santa” - renasceram e assumiram hoje novo e vibrante significado no Islão).

Kaballah: visão mística e mítico-poética

É certo que a noção nuclear de“contra-história” - estritamente falando – reduz-se em tomar a história “a contrapelo”, na sobrecarregada formulação do filósofo judeu alemão Walter Benjamim, ou pelo “avesso”. Para uma compreensão mais clara do conceito de “contra-história”, nada melhor do que recorrer à obra de David Bial “Gershom Scholem: Kabbalah and Counter-History”, “Cabala e contra-história: Gershom Scholem” (Perspectiva, S. Paulo, Brasil, 2004) – que nutriu essas considerações preliminares. A “contra-história”, aqui entendida em sua dimensão significativa, é constituída pela Kabbalah a partir de uma visão mística e mítico-poética da história judaica em um determinado momento histórico.

Tradição subterrânea

Tal como Gershom Scholem (1997-1987) o indica, a Kabbalah, uma tradição recalcada e esotérica, constitui a chave da vitalidade do judaísmo como tal. Torna-se crucial considerar esta tradição “subterrânea” ou “secreta” – onde latejam poderosas forças que re-ligam o mito e a mística - para discutir a história “dominante” ou “oficial”. O exame do messianismo judaico a este respeito, põe de manifesto a versão heterodoxa face a um modelo cultural hegemónico - sem as habituais fórmulas autoritárias ou dogmas – uma natureza intrinsecamente anárquica em exclusividade. Este comentário permite compreender por que o advento do Messias pode achar-se posta como abolição das restrições da Torá, dando início a uma transformação gradual cuja finalidade parece ser a do desaparecimento das interdições e proibições.
Evoca-se, suficientemente, a kabbalah como a chave para a “vida secreta do judaísmo”. Deste modo, as suas melhores análises desvendam não só o papel desempenhado pela mística na revitalização do judaísmo, mas também das “contra-histórias” radicais que apontam para movimentos subterrâneos e mesmo heréticos.

Escolha e fanatismo

O nosso âmbito parece mover-se num círculo vicioso: a ortodoxia e a heresia, a fé, a dúvida e a fé rival. Pensar hoje na heresia é admitir que a “escolha” se tornou uma prioridade. Pois bem. O pluralismo da sociedade e o relativismo das cosmovisões na modernidade se apoderou dos indivíduos. Se considerarmos mais pormenorizadamente o caso, verificamos que o pluralismo e a tolerância originaram-se do “ethos” do nosso tempo: a chamada urbanização. A modernidade não seria então mais do que a universalização da heresia, um resultado necessário da pós-modernidade? Como entender o “imperativo herético” nessa vertente do sagrado des-reprimido e incontornável? Será questão de moda ou consequência do actual dinamismo post-cristão?
Podemos reclamarmo-nos de uma “contra-história” da fé? Sabendo que, em princípio, no decorrer da história humana, a maioria do fanatismo tem sido religioso?

2007/05/04

Dona Gracia, A Senhora (1510-1568)
















Dona Gracia, A Great Portuguese
mlopesazevedo

In the recent RTP TV contest to determine the greatest Portuguese, the ten finalists were all men. There are many women that could and should have been on the finalists list but are forgotten or ignored by dominant patriarchal rulers. One of them is Dona Graçia, born in Lisbon in 1510 of Spanish parents who were expelled from Spain in 1492 along with all other Jews. In Portugal, they were forcibly baptized in 1497 by King Manuel. Dona Gracia Nasi, born Beatrice de Luna, known to history as the Senhora, was the wealthiest banker of her day. She lent money to the Kings of Europe, including John III of Portugal,Henry VIII of England , Francis II of France, Charles V, the Holy Roman Emperor, and also to the Sultan of the Ottoman Empire. She was a patron of the arts, fed the hungry and gave refuge to the persecuted. And she is forgotten.
Dona Gracia married Francisco Mendes whose family had made a fortune on the pepper trade from India. The Mendes banking empire had spread far and wide with offices in Antwerp and representatives in several cities including London. Sadly, Dona Gracia became a widow at 25 years old. She was forced to leave Portugal when King John III insisted she hand over her two year old daughter to be raised in the court and of course, take part of the family fortune with her. She fled to Antwerp to join her brother-in-law Diogo, but he also died shortly thereafter. During this time she not only managed the family banking empire but also engaged lobbyists in Rome and paid huge bribes to keep the dreaded Inquisition from entering Portugal. She was forced to leave Antwerp after a personal meeting with the regent queen of the Netherlands, Marie, sister of the powerful Charles V of Spain, in which she refused the Queen's entreaties to marry her daughter to an Iberian nobleman. On the pretext of returning to a country spa for health reasons, she and her considerable entourage made there way, overland, to Venice where she was briefly arrested on charges of Judaizing and later to liberal Ferrara before settling in Constantinople where she died in 1568.
Dona Gracia was a woman ahead of her time. She refused to remarry because according to the laws of that time, she would have lost control of the family fortune. She was independent. She refused the efforts of kings and queens to force the marriage of her only daughter. She was defiant. When in 1555 pope Paul IV ordered the trial of Portuguese Jews in the papal city of Ancona where they had been promised freedom, she organized an unheard of economic boycott of the port, even though more conservative elements in the Jewish community opposed it. She was courageous and determined. She supported the printing house of Abraham Usque in Ferrara which published, Menina e Moça, a canonical Portuguese romance, amongst other important texts. She valued books. She supported the arts.She paid for the establishment of schools. She valued education. She convinced the Sultan, Suleiman the Magnificent, to grant her Tiberius in Palestine for the re-settlement of Marranos (mostly Portuguese Jews who were forcibly baptized in 1497). She was a leader. She supported the Portuguese intellectual community in exile, such as the pioneer physician, Amatus Lusitanus whose texts are still referred to today and which are dedicated to her. She was patriotic. She is said to have personally fed 80 people a day from her household. She was benevolent. She was and is a truly great Portuguese.

DONA GRACIA MUSEUM

2007/05/03

PÈRE LACHAISE CEMETERY, PARIS

CAMILLE PISSARO (1830-1903)

(also father, mother and grandfather, Joseph Gabriel, born 1777 in Braganza, Portugal)

See more on Pissaro's Jewish Identity
http://www.tau. ac.il/arts/ projects/ PUB/assaph- art/assaph5/ articles_ assaph5/Rachum. pdf




AMEDEO MODGLIANI (1884-1920)
descendant from the Espinosa (Spinoza) family on his maternal side

PEREYRE, a family of bankers and merchants from Braganza, Portugal