2007/01/25

LADINA TERTULIAS
HEBREW EDUCATION IN LIGHT OF THE TORAH,

Sunday, January 28, 2007 22.h
at the LITERARY CLUB OF PORTO,
Porto, Portugal



CONFERENCE THEME/TEMA DA CONFERENCIA
Luis Gonzaga Grego

O Judaísmo assenta no conceito de rectidão e pode ser definido como uma cultura religiosa porque se baseia em crenças e num modo de vida. O Judaísmo não é transmitido geneticamente mas sim culturalmente e dentro de cada família através do exemplo e da influência. O processo de transmissão é o da educação em sentido lato, uma vez que aquilo que é transmitido não é apenas conhecimento mas também crenças e valores, atitudes e ideias, e sobretudo, um sentido de identificação e comprometimento. A ideia de que a vida humana é sagrada, porque criada à imagem de Deus, foi o preceito central da ética judaica. Tudo provem de Deus, cabendo ao homem o uso temporal desses dons: deve, por exemplo, arar a terra tendo em vista o seu uso pelas gerações vindouras.

A responsabilidade de transmitir o Judaísmo advém do Sinai, isto é, da obrigação contraída pelos antepassados quando em seu nome e em nome dos seus descendentes estabeleceram uma Aliança com Deus [1]. A transmissão do Judaísmo é uma tarefa para cada sucessiva geração de Judeus [2].

As tradições do povo Judeu eram difundidas oralmente na família através do pai e da mãe, responsáveis pela educação dos filhos a quem exigiam obediência do mesmo modo que Deus exigia ao seu povo.

As práticas educativas assentavam essencialmente na observação, no exemplo e na participação nas actividades familiares e religiosas nas quais o pai exercia duas funções: mestre e sacerdote. A partir do séc. VIII a.C. esta relação foi sendo formalizada e os escribas e sacerdotes assumiram progressivamente um papel mais importante na formação das crianças. No séc. III a.C. surge a Escola Sinagoga Elementar cujos pontos centrais de estudo eram o Pentateuco [3] e a literatura sapiencial em ordem a fortalecer a identidade comunal e a preservar a herança da fé ancestral. A escola judaica era uma escola destinada a todas as crianças porque a lei judaica assim obrigava todos os pais em todas as comunidades e tinha por objectivo instruir o discípulo na leitura e na compreensão das Escrituras Sagradas, no conhecimento da Lei Oral, por forma a prepará-lo para o estudo da Tora e para o Culto Divino. O povo Judeu foi uma das primeiras comunidades da antiguidade a insistir num ensino formal para todo o povo, praticando a alfabetização de adultos, a educação da população em geral e iniciando as crianças desde os seis ou sete anos de idade até aos 13 anos, sob a tutela do escriba. Estudavam a Tora, que além do Pentateuco inclui o corpo de tradições e interpretações que tratam da liturgia, e estudavam aritmética e hebraico antigo. No que se refere ao estudo da Tora, a democraticidade do processo ia ao ponto de juntar todas as crianças [4]. A educação habilitava os alunos a ler os livros da Tora e dos Profetas e a levá-los a uma compreensão de modo a que o conhecimento da Tora fosse suficiente para fazer participar a criança no estudo público desta e encorajá-la no desenvolvimento e expansão da tradição oral.

O processo educativo inculca no aluno não só o orgulho mas também a piedade e a humildade como membro de um povo santo. A sua educação fundamenta-se na crença de que Deus escolheu os Judeus para servirem de instrumento mas que a falta de fé desvia a sua posição privilegiada no caminho da salvação. Caso haja este desvio só a rectidão pode salvar o povo. Entendemos deste modo porque é que a educação tenta criar uma consciência cultural e cívica totalmente religiosa, ensinando valores individuais, integridade moral e religião: pretende-se que os judeus assimilem esses valores e que os pratiquem no dia a dia. A ênfase no trabalho manual e na dignidade deste é atestada pelo facto de mesmo os maiores estudiosos, os Rabinos e os profetas exercerem uma profissão: Jesus era carpinteiro. Era aceite que o trabalho manual enobrecia o carácter humano. No ensino da religião o processo educativo enfatiza a santidade mostrando que a única forma de se alcançar a rectidão pessoal é através da

disciplina moral, da contemplação, da oração e na conduta do dia a dia. É muito importante formar uma pessoa moralmente correcta porque o que importa na vida é aquilo que a pessoa é e não o que sabe fazer. Este facto explica o porquê de não haver preconceitos entre as profissões hebreias: as pessoas são julgadas pela sua rectidão de carácter.

Sabe-se que a prática da educação é muito anterior ao pensamento pedagógico. Tal pensamento surge em decorrência da reflexão que se faz em cima da prática da educação, como necessidade de sistematizá-la e organizá-la em função de determinados objectivos. O oriente [5] afirmou principalmente os valores da tradição, da não violência, da meditação e ligou-se principalmente à religião. Apesar das mudanças que experimentou, a educação judaica conserva ainda o ideal temático: Deus como princípio e fim, mestre e modelo da formação do povo.

Os livros sapienciais do Antigo Testamento são um manual para o êxito na vida, referem-se ao destino dos indivíduos, ensinam que a verdadeira sabedoria é não mais que o temor a Deus e que este temor é piedade. A origem da sabedoria deve ser procurada na vida familiar porque todo o conhecimento acumulado de geração em geração, o conhecimento sobre a natureza e sobre os homens, tudo isto é expresso em pequenas sentenças, ditados populares que possuem uma aplicação moral e que servem de normas de conduta. O ensino oral é compatível com este género de sabedoria, fácil, curta, simples, breve.

Neste debate procuraremos expor os ensinamentos do Livro dos Provérbios, do Eclesiastes e do Eclesiástico relacionando-os com a educação judaica, mais propriamente com o Judaísmo Sapiencial para quem o universo é o espelho perfeito da vontade de Deus, verdade que nos é transmitida através da experiência pessoal e da vontade colectiva.





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[1] Tomou o livro da Aliança e o leu para o povo; e eles disseram: "Tudo o que Iahweh falou, nós o faremos e obedeceremos" ( Ex.24:7).

[2] (...) ele firmou um testemunho em Jacó e colocou uma lei em Israel, ordenando a nossos pais que os transmitissem aos seus filhos, para que a geração seguinte os conhecesse, os filhos que iriam nascer: Que se levantem e os contem a seus filhos, para que ponham em Deus sua confiança, não se esqueçam dos feitos de Deus e observem seus mandamentos; (...) ( Sl. 78:5).

[3] Os cinco primeiros livros da Bíblia formam um conjunto que os Judeus chamam "Lei" ou Tora. Inclui o Livro do Génesis (porque começa pelas origens do mundo), O Êxodo (porque começa com a saída do Egipto), O Levítico (porque contém a lei dos sacerdotes da tribo de Levi), Os Números (por causa dos recenseamentos) e o Deuterónimo ( a segunda lei). Foram apresentados como lenda transmitida oralmente, de várias tribos hebraicas e alcançou a forma escrita depois do Exílio.

[4] "(...) o filho de um mendigo ou de um homem rico, o filho de um Haver (indivíduo) ou de um personagem ilustre da cidade, juntamente com os filhos dos homens ignorantes e pessoas de baixa estirpe ou mesmo os filhos de vários malfeitores e homens perversos.", Shmvel Safrai, Educação Elementar no Período Talmúdico, p.160-161, In Vida e Valores do Povo Judeu, UNESCO, 1969.

[5] A literatura sapiencial floresceu em todo o Antigo Oriente. Tem poucas preocupações religiosas e fica no plano do profano. Esclarece o destino dos indivíduos colhendo os frutos da experiência. Ensina o homem a conformar-se à ordem do universo e deveria dar-lhe os meios para ser feliz e prosperar.